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Cia Bachiana e Associação de Canto Coral

| Financiamento coletivo, saída para manter atividade musical

15/4/2016 - Por Debora Ghivelder

Recurso é adotado por instituições como a Associação de Canto Coral, que se apresenta no domingo (16/4), na Igreja de Nossa Senhora do Carmo, e pela Companhia Bachiana Brasileira que sobe ao palco da Sala Cecília Meireles em maio

 

Crowdfunding, ou em bom português financiamento coletivo, é definido como obtenção de capital para iniciativas de interesse geral através da agregação de múltiplas fontes de financiamento, em geral pessoas físicas. Por aqui, tem se transformado, com a crise, em muitas vezes a única alternativa para sociedades ou grupos musicais levarem adiante suas atividades. Tanto a Associação de Canto Coral como a Companhia Bachiana Brasileira lançam mão do recurso para angariar fundos para seus projetos.

A Associação de Canto Coral busca financiar a apresentação que realiza neste domingo (16), na Igreja Nossa Senhora do Carmo da Antiga Sé, no Centro do Rio, em homenagem a José Maurício Nunes Garcia. Já a Bachiana tenta viabilizar o seu concerto intitulado A Transfiguração Musical no Século XX, que reúne obras de Arnold Schönberg (A Noite Transfigurada), Igor Stravinsky (Concerto em Ré) e Arvo Pärt (Fratres), agendado para 20 de maio na Sala Cecília Meireles.

É a primeira vez que a ACC adota o crowdfunding. O concerto deste domingo é o primeiro de três  que compõem um ciclo programado pela Associação em parceria com a SAMAS (Associação de Amigos da Igreja de Nossa Senhora do Carmo da Antiga Sé) para homenagear os 250 anos de nascimento de José Maurício Nunes Garcia [reportagem aqui]. Os próximos serão nos dias 21 de setembro e 20 de dezembro.

– O atual cenário da economia nacional tem dificultado muito as possibilidades de patrocínio e de eventuais apoios. Como resultado, vemos que a cultura e arte num geral, como já era de se esperar, vem sofrendo muito com isso – explica Miguel Torres, regente preparador do coro, que conta para este concerto com 55 integrantes. – Portanto, vimos no crowdfunding uma forma mais prática e direta para estimular o nosso público a nos apoiar, e assim arrecadarmos valores que possibilitem as realizações artísticas como esta que faremos no próximo dia 16, e tentarmos de alguma maneira amenizar os impactos que a cultura vem sofrendo devido a este período de tão fraco desempenho econômico.

Às vésperas do primeiro concerto, a Associação – que conta hoje com cerca de 160 pessoas entre cantores e associados que contribuem e participam dos cursos e coros, com uma mensalidade social de R$ 40 – ainda está distante de amealhar o valor desejado. Explica Miguel:

– Temos diferentes metas e estratégias para a realização do concerto, que vai desde a quantidade de músicos que podemos contratar ao investimento em divulgação. A meta mínima é R$ 14 mil; Porém, só conseguimos arrecadar até o momento cerca R$ 3.500. Por isso, além do crowdfunding estamos recorrendo também aos amigos da Associação de Canto Coral para que façam suas doações diretas através do Banco do Brasil ag. 0392-1, conta 909.565-9.

Já a Bachiana Brasileira recorre pela segunda vez ao expediente para financiar a apresentação, cujo programa, segundo o regente Ricardo Rocha, oferece um painel com três dos mais importantes compositores do século passado, representando, assim, algumas das mudanças cruciais produzidas nos últimos cem anos de expressão musical no Ocidente.

Na primeira tentativa, quando buscaram verba para realizar seu concerto de 30 anos, em 2016, no Municipal do Rio, a companha foi muito bem-sucedida. Ultrapassou a meta de R$ 57 mil. Naquela ocasião, Ricardo Rocha declarou que não pretendia mais lançar mão do financiamento coletivo. Mas, mudou de ideia. O crowdfunding, explica Ricardo, é na verdade um complemento para se realizar o concerto na sala Cecília Meireles, já que a Bachiana possui uma série no Planetário, que abriga a première desse programa.

– A possibilidade é de conseguirmos recursos para uma segunda récita, na Sala Cecília Meireles, para levar estas obras a um público maior. Afinal, se Fratres é inédita no Rio de Janeiro e terá sua primeira audição conosco, as outras duas praticamente quase nunca são tocadas no Brasil. Só que isso implica o pagamento à orquestra de mais um cachê, gastos com registro de som e imagem, pagamento à FUNARJ para liberação entre outros custos – responde o maestro. – Nossa meta para esta complementação ao concerto do Planetário é de R$ 24 mil, para captação até 10 de maio.

Até o momento, os valores da arrecadação somam R$ 9 mil.

A iniciativa também não pretende ser abandonada pela Associação de Canto Coral. Segundo Miguel, a ideia é a de recorrer sistematicamente a esta alternativa.

– Esse tipo de financiamento tem uma comunicação com o público muito interessante, que passa a se identificar com a causa da cultura. Temos a impressão que campanhas como estas estimulam a repensarmos sobre a responsabilidade social que devemos ter também para manter o desenvolvimento da arte onde vivemos, além de despertar a atenção de novos públicos para os concertos que realizamos e as atividades dos cursos e coros que são mantidas na Associação de Canto Coral.

Brindes aos doadores

Tanto a Associação de Canto Coral como a Companhia Bachiana Brasileira oferecem prêmios aos doadores. A primeira oferta partituras, CDs e DVDs de obras corais, desconto em cursos e coros da Associação de Canto Coral, além de agradecimentos em mídias sociais e nos programas de concerto. A segunda acena com brindes diferenciados, dependendo do valor doado. Vai de Dvds, CDs e ingressos a nome do doador impresso como apoiador a curso completo com o maestro Ricardo Rocha no Centro Cultural Justiça Federal, passando por quadros com a coleção de moedas comemorativas das Olimpíadas Rio 2016 em estojo de madeira, veludo e vidro, numerados e assinados.

É claro que o presente maior, entretanto, é ver estes concertos, com programas  especiais, tomarem forma e acontecerem. O tributo a José Maurício traz, na primeira parte, a Abertura em Ré, do compositor brasileiro e a Sinfonia nº 27 de W.A. Mozart. Na segunda parte, cria-se a ambientação  para um domingo de Páscoa com as vésperas e as matinas escritas especificamente para o período do ano. É aqui que entra uma obra recentemente restaurada de José Maurício, como conta Miguel:

– Ano passado, quando estávamos organizando e pesquisando o repertório do Padre para a temporada da Associação de Canto Coral de 2017, nos deparamos em nossos arquivos com as partituras manuscritas das Matinas da Ressurreição. Este material é muito antigo, e boa parte foi organizada ainda pela professora e maestrina Cleofe Person de Mattos, fundadora da ACC. Por isso, pela fragilidade do material e de seu valor histórico, logo vimos que, se quiséssemos executá-lo pelo coro e orquestra, teríamos que reeditá-lo. Então, procuramos Antônio Campos Monteiro Neto, que prontamente nos ajudou e editou a partitura.

Já a Bachiana finca o pé no século XX trazendo obras representativas de três compositores emblemáticos  em momentos distintos.

–  O austríaco Arnold Schönberg (1874-1951), abre o programa com sua obra prima A Noite Transfigurada. Escrita em 1899 a partir de um poema de Richard Dehmel, teve sua estreia em 1902, causando enorme polêmica, também por seu conteúdo sexual. Já com o russo Igor Stravinsky (1882-1971) e seu Concerto em Ré, de 1946, o que nos motivou foi apresentar a rítmica típica e o resgate do modalismo daquele que daria, de fato, a saída que a música ocidental demandava. Por fim, representando o final do século XX, apresentamos  Fratres do compositor estoniano Arvo Pärt (1935), escrita entre os anos 1977-1991. Nela, assim como em toda a obra de Pärt, a linguagem modal é afirmada como a mais natural do espírito humano, devolvendo-nos a experiência da transcendência na música, com interesse fora do indivíduo, confirmando a transfiguração musical do século no retorno às origens da sacralidade e da pureza modal.